o amor me fez perguntas mas eu não tenho respostas, só cores.

Dia 3 de abril de 2018
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Sobre Textos

Eu não lembro quando foi a última vez  que eu me sentei para escrever sobre o amor e as palavras vieram alcançar a ponta dos meus dedos como quem corre uma maratona de 5km pela primeira vez e quer muito cruzar a linha de chegada pra provar que conseguiu. Dessa vez vieram. Eu olhei para um lado, olhei para o outro e lá estavam elas sentadas ao redor da mesa com as mãos cruzadas uma sobre a outra me encarando como quem espera um posicionamento importante de uma pessoa que toma sérias decisões.

As palavras me esperaram aqui.

Sinto que ficaram paradas por muito tempo, e mesmo correndo e me esforçando muito eu não estava pronta para alcança-las. Falar de amor é – sempre – falar sobre o tempo. E impreterivelmente, mesmo que implicitamente, estamos presos dentro do diâmetro do relógio. E podemos correr, correr, correr, mas nunca sair pra fora dele. E podemos correr, correr, correr, os ponteiros eventualmente vão nos alcançar.

Os ponteiros me alcançaram aqui.

Foi num por do sol desenhado pelo dedo de Deus que enxerguei cores que há muito tempo vinham correndo pra longe de mim. É tão engraçado as cores que Papai escolhe pintar certos capítulos. Dessa vez o amor veio numa paleta de verdes e tons terrosos. As palavras que dançaram na ponta dos meus dedos e me esperaram, por muito tempo, até que eu estivesse pronta para entender onde deveriam estar e sobre quem gostariam de falar, despontaram num horizonte da hora mais dourada e escapuliram pra fora de uma boca através de uma risada, escalando por uma bochecha redondinha até se içarem pelos meus ouvidos desbravando territórios há muito tempo perpetuados pelos meus tons frios de azuis e lilases.

As cores dele me encontraram aqui.

E eu lembro que eu não percebi. Eu lembro que eu não vi acontecer. Me falaram que talvez acontecesse, me avisaram que poderia acontecer, me disseram quando saí de lá que talvez tivesse acontecido, mas foi tão natural a junção daquelas cores que eu não enxerguei até que o quadro tivesse bem misturado. Era uma imagem bonita de se ver, olhando pra ela é como se eu tivesse passado muito tempo me dedicando a pintá-la mas foi tão mais rápido do que todos aqueles quilômetros em que corri das palavras, corri contra – e atrás – (d)o tempo, escrevi – mas principalmente apaguei – sobre o amor.

A arte dele me coloriu aqui.

Eu não sei por quanto tempo ele rascunhou num quadro em branco. Não sei sequer se estava procurando essas cores – não fui autorizada a fazer essas perguntas -, não sei se ele achou a pintura bonita, se ele gostaria de pendurá-la por ai. Por vezes temo que perguntar seria disparar suas pernas em uma corrida longa demais contra ponteiros que não posso mais tentar alcançar. Eu senti o amor dele, ou o que poderia ser esse amor. Mas falar sobre isso é – sempre – falar sobre o tempo, e apesar de esse ter sido um dos relatos mais fáceis e sinceros que já consegui pintar com palavras, tenho medo de que eu vá fazer perguntas e ao olhar ao redor da mesa elas ainda estarão lá com as mãos cruzadas umas sobre as outras esperando respostas que eu não posso dar.

Tampouco se elas me perguntarem sobre o amor eu não saberei responder, pois corro ao redor do relógio sendo perseguida – e às vezes perseguindo – um ponteiro de amor que é pincel numa tela que não pinto sozinha.

As respostas dele não estavam naquela colina verde naquele dia, e se estavam a luz do sol em seu sorriso me ofuscou o olhar com tantas cores que eu não lembrava que existiam. Mas pra sempre espero a primavera, é quando nascem as mais bonitas flores roxas.

Você não imagina que arte linda vai encontrar por ai, natureza afora. Há tanto mundo depois do horizonte que é o diâmetro do relógio. O negócio é que não é, nunca, possível correr deles. É preciso esperar o tempo dos ponteiros nos alcançarem, e às vezes, só de vez em quando, sabe? Numa badalada entre as doze, um clique acontece e a arte sobrevive, colorindo o mundo inteiro novamente quando duas paletas se encontram.